Home >> Quem Fez História >> União pela cafeicultura em Minas Gerais
Cooxupé, uma das cooperativas mais antigas do Estado, surgiu quando 23 agricultores decidiram driblar crise no setor
Por: Sandra Carvalho Em 20 de setembro de 2022
Numa época em que o mundo vivia os efeitos do crash de 1929, que o Brasil iniciava a industrialização e que Minas Gerais se mobilizava para retomar o posto de protagonista na economia nacional, nasceu a Cooperativa Regional de Cafeicultores de Guaxupé (Cooxupé).
Na verdade, o empreendimento coletivo começou como cooperativa agrícola de crédito em abril de 1932. Posteriormente, em 1957, face à grande vocação dos cooperados para a cafeicultura, iniciou as atividades de recebimento, processamento e comercialização de café.
Hoje, com quase 18 mil cooperados em 300 municípios do Sul de Minas, Cerrado Mineiro, Matas de Minas e Vale do Rio Pardo (a média Mogiana Paulista), a cooperativa tem representatividade de 18% na produção nacional de café e de 26% em relação ao grão produzido no Estado. São cerca de 2.500 funcionários. Estima-se que as operações da Cooxupé envolvem um contingente superior a 1 milhão de pessoas.
A trajetória de 90 anos da Cooxupé é tema nesta quinzena do especial “Quem fez história”, um presente do DIÁRIO DO COMÉRCIO a leitores e internautas em comemoração aos também 90 anos do jornal.
“Não sei dizer se é a cooperativa mais antiga de Minas Gerais em operação, mas, certamente, está entre as mais antigas. São 90 anos de história”, disse Melo, que está na diretoria da Cooxupé há 31 anos, sendo cooperado há mais de 40 anos.
Segundo ele, tudo começou em 1932, bem no início da “Era Vargas”, época em que o Brasil ainda sentia os efeitos do crash de 1929, quando a bolsa de Nova York quebrou e atingiu em cheio a cafeicultura brasileira.
Vinte e três agricultores se uniram na cidade mineira de Guaxupé, no Sul do Estado, em uma cooperativa agrícola de crédito. “O foco, desde o início, sempre foi o café, porque, dada a crise forte na cafeicultura, consequência de uma crise mundial, havia necessidade de crédito para os cafeicultores se restabelecerem”. Segundo Melo, o projeto da cooperativa financeira deu certo e se expandiu para outros municípios da região. “O crédito, ainda hoje, é uma das principais áreas de atuação da cooperativa”, disse.
Trinta e cinco anos depois, diante do crescimento do número de cooperados e do número de municípios nos quais a cooperativa de crédito atuava, novas demandas surgiram. “Fazia-se necessário outros serviços, não bastava apenas a área de crédito e comercialização. Era preciso ter uma área de armazenagem e expedição de café”, contou o presidente.
Foi então que, em 1957, sob a então liderança de Isaac Ribeiro Ferreira Leite, a cooperativa montou essa estrutura e passou a ser uma cooperativa de cafeicultores que abarcava desde o fomento à produção, passando pela armazenagem até a comercialização de café. O recebimento e armazenagem de café eram feitos em depósitos da rede ferroviária da Mogiana Paulista, de onde o café era despachado.
Com todas essas áreas estruturadas, a Cooxupé já tinha condições de buscar novos mercados e, em 1968, passou a exportar café.
“O primeiro embarque foi para nosso vizinho Chile. Foram 278 sacas de café. E, embora hoje o Chile represente uma parcela pequena das nossas exportações, esse embarque foi muito representativo na história, pois abriu novos mercados. E isso alavancou a cooperativa, tanto que hoje as exportações são o nosso carro-chefe”, relatou Melo.
Hoje, 80% da venda de café da cooperativa é para o exterior. No ano passado, foram comercializadas ao todo 6,027 milhões de sacas de café, das quais 4,9 milhões foram destinadas ao mercado internacional, englobando mais de 50 países. Entre os principais compradores estão Alemanha, Argentina, Bélgica, Canadá, Espanha, Estados Unidos, Itália, Japão e Suécia.
O ano de 1978 também é considerado um marco na história da Cooxupé, segundo o presidente Carlos Rodrigues Melo. Foi inaugurada a matriz da cooperativa no município de Guaxupé e, o mais importante, uma unidade própria de armazenamento.
“Até então, recebíamos café nos armazéns da rede ferroviária da Mogiana Paulista. E, a partir dali, passamos a contar também com uma nova unidade de armazenamento em Guaxupé. (…) A presença nessa inauguração do vice-presidente da República na época, o Aureliano Chaves, mineiro de Três Pontas e também correlacionado à produção de café, foi muito significativa para nós”, observou.
Após 73 anos de fundação, a Cooxupé chegou, em 2005, a 10 mil cooperados, motivo de grande comemoração na época, segundo o presidente da cooperativa, Carlos Augusto Rodrigues Melo. Mas, em um espaço de apenas 17 anos – entre 2005 e 2022 – o número de cooperados saltou para quase 18 mil, crescimento aproximado de 80% em relação a 2005. Segundo Melo, vários fatores ocorridos no período em questão explicam essa expansão.
Um deles foi a inauguração do Complexo Industrial e de Armazenagem Japy, em Guaxupé, no ano de 2012, que elevou a capacidade de recebimento e armazenagem de café da cooperativa. “A área, hoje com cerca de 30 alqueires, fica próxima a um trevo de rodovia e tem uma grande estrutura industrial e tem capacidade para 6,3 milhões de sacas de café”, informou o presidente.
Ainda conforme Melo, a inauguração de 2015 da planta de torrefação no Complexo de Japy foi outro importante passo para diversificar os mercados da Cooxupé. “Nós passamos a ter um café torrado e moído, um produto com maior valor agregado. Hoje, nossa planta de torrefação é a quinta maior do mundo”, destacou Melo. A produção dessa planta específica é superior a mil toneladas mensais.
Com a incrementação na estrutura, foi possível adotar novas operações, como a personalização dos cafés recebidos e a classificação dos mesmos, através da operação conjunta de um laboratório de análise de café associada a um sistema de tecnologia de informação que, por meio de chips, indica a procedência e a qualidade do café.
Outra medida que colaborou para a ampliação do número de associados e foi tomada a partir das demandas apontadas pelos cooperados foi a inauguração do primeiro centro de distribuição de insumos em Guaxupé. Um outro centro foi inaugurado recentemente em Patrocínio, no Alto Paranaíba. Ainda segundo Melo, a criação de núcleos da cooperativa nos principais municípios – hoje são 49 núcleos – também foi importante.
“O trabalho de atrair a participação do cooperado, com assistência técnica e uma infinidade de serviços, foi iniciado com o doutor Isaac Ferreira Leite e incrementado pelo Carlos Paulino a partir de 2003 e agora, na nossa gestão, continua constante. (…) O cooperado é dono da cooperativa. Ele não pode ficar distante. Todas as conquistas se tornam mais fáceis com a participação dele”, frisou o presidente da Cooxupé.
Em 2020 a Cooxupé atingiu a marca de recebimento de 8,1 milhões de sacas de café, sendo 6,6 milhões provenientes de cooperados. Segundo Carlos Melo, neste ano essa marca não deve ser batida devido a diversos fatores, entre eles, questões de bienalidade do café. Porém, há uma meta traçada até 2028, quando a cooperativa pretende atingir a marca de recebimento de 12 milhões de sacas.
Um dos fatores que contribuirá para que essa marca seja atingida é a expansão da atuação da cooperativa para municípios da Zona da Mata, produtora de café arábica. “Há um potencial produtivo de 6 milhões a 8 milhões de sacas nessa região. Com trabalho, confiança do nosso cooperado e credibilidade, os três pilares que nos trouxeram até aqui, vamos atingir essa marca”, finalizou Melo.
E o mais recente marco na história da Cooxupé foi o ano de 2021, quando houve a distribuição histórica de R$ 120 milhões aos cooperados.
A Cooxupé já nasce diante de um desafio: fomentar a cafeicultura por meio do crédito. Mas, ao longo da trajetória da cooperativa, ocorreram alguns obstáculos, como, por exemplo, pragas, geadas, questões climáticas, falta de incentivos governamentais à atividade e, atualmente, uma pandemia.
Entre os períodos desafiadores, o presidente da Cooxupé, Carlos Augusto Rodrigues Melo, destacou os anos de 1995 e 1996. Houve problemas climáticos e crise na oferta de crédito. “Os programas de recuperação de crédito no período foram importantes para passarmos por essa crise”, contou o presidente.
Mas nada, segundo ele, se compara aos transtornos logísticos causados recentemente pela pandemia de Covid-19. “Tivemos um importante trabalho de prevenção junto aos colaboradores, aos cooperados e às comunidades nas áreas de atuação da cooperativa. O principal problema foi de ordem logística, com a crise no transporte marítimo mundial. Porque o café você só recebe depois que entrega e tivemos grandes problemas logísticos em todo o mundo com a crise dos contêineres”.
Como o carro-chefe da Cooxupé é a exportação, a cooperativa foi afetada pela escassez de contêineres. “Chegamos ao ponto de o custo do contêiner subir mais de 400%”, informou. Uma das formas encontradas para atenuar o problema foi o uso de big bags com transporte no casco dos navios. “Fomos fazendo dessa forma até começar a aparecer os contêineres. Mas, até hoje, essa questão ainda não está totalmente normalizada em todo o mundo”, observou.
A agenda ESG (sigla em inglês para responsabilidades social, ambiental e governança corporativa) vem sendo trabalhada na Cooxupé ao longo das décadas. No final do ano passado, a cooperativa liderou o ranking Maiores e Melhores 2021 da revista “Exame” no quesito ESG.
“O cooperativismo em si é uma forma de associação que inclui responsabilidade social. Nossa missão principal é levar qualidade de vida aos cooperados e à sociedade, agregando valor ao café”, definiu o presidente da Cooxupé, Carlos Augusto Rodrigues de Melo.
Segundo ele, a responsabilidade social vai desde o treinamento, capacitação e atendimento às demandas dos cooperados e das comunidades em que eles vivem. “Em muitas cidades pequenas, a cooperativa é uma espécie de referência para tudo”.
A responsabilidade ambiental engloba, entre outras ações, o tratamento específico e cuidados com nascentes de rios e o trabalho do núcleo de educação ambiental. “Isso é uma constante, e com melhoria contínua”.
Mas nada seria possível, segundo Melo, sem a governança corporativa. “É uma gestão onde há representatividade de cafeicultores de todas as regiões, de forma organizada para que todas as demandas sejam analisadas e atendidas de forma técnica e os serviços sejam prestados com qualidade”, enfatizou.