Home >> Há 90 Anos >> Informador vira Diário do Comércio e amplia profissionalização da redação
Jornal reduz análise política, aprofunda noticiário econômico e traz o offset para MG
Por: Sandra Carvalho Em 17 de agosto de 2022
Foi em 18 de outubro de 1960 que o Informador Comercial passou a se chamar “DIÁRIO DO COMÉRCIO”. Mas essa seria apenas uma das várias transformações pelas quais a publicação passaria ao longo da década. Uma maior profissionalização da redação, assim como alguns cuidados editoriais em razão da ditadura militar e um mergulho ainda maior na cobertura econômica também marcaram o período.
Mas a grande notícia ao longo dos anos 60 se deve ao pioneirismo do fundador José Costa, que trouxe para Minas Gerais o que havia de mais moderno em impressão de jornais. O DC foi o primeiro jornal no Estado e o segundo no Brasil a implantar o sistema de impressão offset.
Os acontecimentos relatados a seguir são baseados no livro “José Costa – Parceiro do Futuro”, de autoria de Lígia Maria Leite Pereira, Maria Auxiliadora de Faria e Nair Costa Muls, lançado em 2007 pela Rona Editora.
Com as mudanças gráficas iniciadas na década anterior, o DIÁRIO DO COMÉRCIO começa os anos 60 com uma diagramação mais leve. No entanto, continua aprimorando a apresentação gráfica: o nome passa a ser fixo na parte superior da capa, títulos das chamadas de matérias ficam mais destacados e modernos e o uso de fotografias se torna mais regular. Algumas colunas continuam, outras desaparecem e ainda surgem as novas: “Flagrantes”, assinada por Aristoteles Atheniense; “O Mundo em Marcha”, por Humberto Mandarino; e o “Informador Fiscal”, por Elson Miranda. O jornal mantinha em sua cobertura diária a missão de estimular o desenvolvimento de Minas Gerais e do País, proposta desde a sua criação.
Já consolidado como porta-voz das entidades da classe, o DC continuava cobrindo o dia a dia dessas associações e trazia cada vez mais reportagens sobre anseios e preocupações do mundo empresarial em relação à política econômica. Foi assim, por exemplo, quando em 26 de maio de 1961 publicou o memorial enviado pelas classes produtoras ao recém-empossado presidente Jânio Quadros, em solidariedade às instruções 113 e 204 da Superintendência de Moeda e Crédito (Sumoc), que, no entendimento daquele momento, procuravam atenuar a inflação, estimular as exportações e impulsionar a indústria.
O documento era assinado pela Associação Comercial e Empresarial de Minas (ACMinas), pela Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), pela União dos Varejistas de Minas Gerais (UVMG) e Sociedade Mineira de Agricultura, entre outras entidades. Porém, após acompanhar debates sobre o assunto na Faculdade de Ciências Econômicas da UFMG, o editorialista Osório da Rocha Diniz entendeu que aquelas medidas na verdade acentuariam as desigualdades sociais e deixa isso claro em um editorial.
O jornal continuou defendendo que a indústria nacional fosse desenvolvida e que o minério ficasse no País. Nesse contexto, vinha ainda a defesa da viabilização de um grande plano ferroviário, uma das poucas metas não alcançadas no Plano de Metas de Juscelino Kubitschek na década de 1950.
A defesa das reformas de base proposta por João Goulart, sobretudo a reforma agrária, também era tema frequente, embora o jornal não poupasse críticas à política econômica de Jango. O aguçamento da crise política pré-golpe militar foi interpretado por Diniz como algo “armado por grupos financeiros internacionais, que queriam impedir o desenvolvimento do País”.
O DIÁRIO DO COMÉRCIO deu ampla cobertura ao golpe militar de 31 de março de 1964, chamado nas páginas de intervenção militar. Noticiou as repercussões, as cassações dos direitos políticos e as posições do então governador de Minas Gerais, Magalhães Pinto. No entanto, diante do clima de insegurança que se instaurou no País, houve certa prudência da publicação em relação ao regime, já no início da ditadura, quando a censura ainda era velada.
Segundo o jornalista e presidente do Conselho Gestor do Jornal, Luiz Carlos Motta Costa, ex-chefe de redação, ex-presidente do DC e filho de José Costa, essa postura de críticas mais contidas e mergulho ainda mais profundo no noticiário econômico foi adotada após a prisão de José Costa, ocorrida cinco dias depois do golpe de 1964, sob a falsa acusação de “ligações subversivas com chineses”.
Mas a história que culmina na prisão do fundador do DC começa quatro anos antes, em 1960, quando José Costa é convidado a integrar a delegação que representaria o Brasil no II Encontro Internacional de Jornalistas, realizado em Baden, na Áustria. No decorrer do congresso, Costa e colegas jornalistas foram convidados a conhecer a China. Essa viagem se dá na mesma época em que João Goulart visitou o País comunista para relações comerciais.
Em sua estadia pela China, José Costa fica impressionado com o potencial econômico do país asiático. “Estive com Mao-Tse-Tung por duas horas. Ele queria saber tudo sobre o desenvolvimento do Brasil, porque exportávamos minério, que tipo de indústrias tínhamos, assim por diante. Lembro-me que nos disse: na China vamos demorar de dez a 20 anos para começar a sair da miséria”, relatou José Costa em texto escrito na época.
Ao conhecer o secretário da Associação Comercial de Xangai e proprietário de uma fábrica de tecidos, o jornalista brasileiro aprofundou contatos com ele, pensando em futuras relações comerciais, já que naquele momento o Brasil apostava em uma política externa mais independente.
“Após esses contatos, em 1961, uma missão comercial de oito chineses veio ao Brasil e se estabeleceu no Rio de Janeiro. Eles vieram a Belo Horizonte e foram recebidos pelo meu pai, que os colocou em contato com grandes empresas, entidades de classe como a Fiemg e a ACMinas, com alguns sindicatos e com o governador Magalhães Pinto. Os chineses estavam preparando uma feira industrial e comercial que seria inaugurada em 1964, no Rio. Essa feira, porém, não chegou a se realizar porque eles foram presos e acusados de serem espiões comunistas. Quando vimos no jornal ‘O Globo’ a manchete ‘Espiões chineses são presos no Rio’, percebemos que a prisão de papai se daria a qualquer momento”, relatou Luiz Carlos.
José Costa foi preso no dia 5 de abril de 1964, levado ao Departamento de Ordem Política e Social (Dops), em BH, e transferido para uma penitenciária em Ribeirão das Neves. Ele ficou detido por mais de um mês. Segundo Luiz Carlos, tudo não passou de uma articulação do então governador do Estado da Guanabara Carlos Lacerda, um dos principais articuladores do golpe militar. “O Lacerda queria ser presidente a qualquer custo e, na briga de poder de quem aparece mais no auge da revolução, ele articulou esse jogo dos supostos chineses espiões. Não eram espiões, e todos sabiam da missão comercial, tinha nome e endereço, ninguém estava escondido”.
Após a prisão, o jornal deixou de lado a cobertura política e mergulhou ainda mais na cobertura econômica. Os editoriais oscilavam entre a crítica ao governo João Goulart e aceitação do golpe como necessário, entre aplausos ao novo regime e a crítica contida à política econômica dos militares. O DC se manteve como porta-voz das entidades empresariais e do desenvolvimento de Minas. Entre as boas notícias do período, destaca-se a ampla cobertura à inauguração da Refinaria Gabriel Passos, em março de 1968.